Mosca na sopa

Depois de alguns "muitos" anos de relacionamentos frustrados, amores platônicos e total solidão (tirando um beijinho aqui e ali), estava completando um ano de namoro. Caramba! Imaginei uma série de detalhes para comemorar, comidinha especial, roupa nova, música romântica...

Mas eis que na véspera acordo com o lábio supeiror um tanto inchado e áspero. Já fiquei estressada, era hora de aparecer um negócio desses? Enfim, tenho a sorte (ou azar, sei lá) de trabalhar em hospitais, o que me facilita um pouco em casos de necessidade de consultas de emergência. E neste dia estava de plantão junto com uma famosa dermatologista, que me foi muito bem recomendada pelas colegas. Não gosto muito de pedir favores, mas não tendo outra alternativa, lá fui eu.

Até que ela me recebeu de boa vontade, estava cercada por residentes, provavelmente passando por algum tipo de treinamento com ela, dado seu tom um tanto teatral, espalhafatoso. Contei-lhe o ocorrido e ela me olhou, um tanto estrábica, por trás das lentes grossas. Desse momento em diante ela passou a me ignorar, dirigindo-se apenas a uma residente de origem japonesa ao seu lado.

- Ah, está vendo, é herpes!

A moça olhou para ela com uma calma genuinamente oriental e não esboçou comentário. Achei que sua vontade era de discordar, mas não teve coragem diante da especialista. Eu, não preciso nem dizer, estava de boca aberta, aparvalhada, diante de notícia mais ingrata.

- Mas eu não tenho herpes...

- Agora tem, minha filha.

Vira-se novamente para a residente:

- Está vendo isso aqui? Amanhã vai desabrochar igual a uma flor!

Dessa vez a pupila não resistiu:

- Não estou vendo nada não...

Bem, fim de papo, estava sumariamente dispensada e condenada a adiar meus planos de comemoração, uma amostra grátis de pomadinha na mão. Inacreditável, depois de tanta preparação ia ter que ficar sei lá quanto tempo mais sem beijar na boca! Não posso descrever o desânimo que tomou conta de mim; só sei que passei o resto do dia mostrando o beiço para todos os médicos que eu cruzava pedindo opinião. E eles olhavam com uma cara do tipo: "acho que não é..."

Enfim, conclusão da história: não houve comemoração, meu namorado (hoje marido) pegou no meu pé durante um bom tempo (ele perde a mulher mas não perde a piada) e há exatos 8 anos e 3 meses espero a tal da flor desabrochar. Que raiva!!!!!!!